quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Conheça as histórias de Ruy,

ruy botafogo 2006 (Foto: Divulgação)

Ruy teve passagem marcante pelo Botafogo (Foto: Divulgação)

 

Lateral-direito, que teve grande passagens pelo Cruzeiro e pelo
Botafogo, ainda sonha em voltar a jogar em um grande clube do país


Ruy Bueno Neto é um lateral-direito voluntarioso, raçudo e vibrante. Começou sua carreira nas categorias de base do América-MG, como volante e sempre chamando a atenção por um ‘pequeno’ detalhe anatômico: a protuberante e saliente cabeça. Mais conhecido como Ruy Cabeção, o jogador já defendeu alguns dos maiores clubes do futebol brasileiro, como Cruzeiro, Botafogo, Grêmio e Fluminense. Hoje, está no Brasiliense, onde disputa a Série C do Campeonato Brasileiro. Mesmo um pouco escondido dos grandes centros, mantém o mesmo bom humor e a visão perspicaz do mundo da bola, que sempre o acompanharam em sua trajetória profissional.

Com 33 anos completados em abril, o jogador ainda tem planos ambiciosos para a carreira. Quer voltar a disputar grandes competições, como a Taça Libertadores e a Série A do Brasileirão. Mesmo se dizendo satisfeito no Brasiliense, Ruy admitiu as grandes diferenças entre a Série C e a elite do futebol do Brasil.

- É muito diferente, em relação à visibilidade e à cobertura da imprensa. Sinto muita falta. Às vezes, reclamo, é gostoso estar sempre em evidência. Mas não tem sido de todo ruim. Estou me revigorando, voltando ao início da minha carreira, onde passei por dificuldades para chegar aos grandes clubes. É um momento de reflexão. Se Deus quiser, vou voltar a disputar uma Série A do Brasileiro. Tenho me preparado para isso. Vou dar mais valor ainda a todos os momentos bons que já tive na carreira.

Violência

Ainda que defenda um clube de menor visibilidade, Ruy disse viver toda a pressão que um jogador de time grande vive. Pressão que se já foi violenta, como em um episódio em que teve sua integridade física ameaçada. Tudo aconteceu após um jogo em Ceilândia, pelo Campeonato do Distrito Federal deste ano. Ruy lembrou o drama vivido pelo atacante Fred, do Fluminense, nos últimos dias.

- Eu tive uma coisa parecida com o que aconteceu com o Fred, recentemente. Isto me fez lembrar algumas coisas relacionadas à era das pedras, não ao futebol. São aquelas ameaças que falam onde eu moro, que vão me pegar fora do estádio. Mas, graças a Deus, nada de mais grave aconteceu.
Ruy lembrou também de uma passagem semelhante, que marcou sua vida, quando ainda defendia o Botafogo.

- No Botafogo, em 2005, foi mais pesado. Fiquei muito triste na época. Depois de uma partida, teve uma situação terrível, como essa do Fred, mais uma vez. Alguns membros de torcida organizada me seguiram até um restaurante, e eu fui retirado de dentro do carro, com minha esposa grávida de seis meses. As ameaças são sempre as mesmas. Disseram que sabiam onde eu morava e onde meus filhos estudavam. Diziam que, se o clube caísse para a Segunda Divisão, nossa vida não ia ser fácil. Tomara que nunca aconteça o que houve com o colombiano Escobar (jogador assassinado depois da Copa de 1994, nos EUA, após fazer um gol contra). Somos artistas e, antes disso, seres humanos.

Bullying do bem

Os assuntos mais pesados com o Cabeção duram pouco. Sempre com um sorriso aberto, o jogador é muito popular no elenco do Brasiliense, que conta com figuras de peso como Tuta (ex-Palmeiras), Bebeto (ex-Vitória) e o uruguaio Beto Acosta (ex-Corinthians e Náutico). Entre piadas e tapas na cabeça, Ruy falou sobre os primórdios do apelido, que o marcou por toda a vida.

- A origem do apelido Cabeção é desde pequeno. Eu sempre fui muito magro, magro mesmo, e o pessoal falava que eu passava fome. Como já tinha a cabeça avantajada, o apelido veio de uma babá. Meus pais contavam que ela morria de medo de me segurar no colo, porque a cabeça era muito grande, e ela achava que meu pescoço ia quebrar. Eu fui crescendo e, com seis anos, ainda com cabelo, parecia um cogumelo, com a cabeça grande e o corpo pequenino. Hoje, o pessoal ia falar que é bullying, mas, na época, eu levei tudo na esportiva, porque sou muito brincalhão. Foi um bullying do bem, e o apelido pegou.

Cabeção para a família e os amigos, o apelido demorou a ficar popular no futebol. Mesmo que fosse repetidas vezes falado no América-MG, primeiro clube de Ruy, a alcunha só pegou mesmo quando defendia o Cruzeiro, depois de um jogo em que o lateral foi um dos melhores em campo. Na final da Copa Sul-Minas de 2002, o Cabeção teve atuação marcante e deu o passe para o gol da vitória do Cruzeiro, por 1 a 0, marcado pelo ídolo cruzeirense Juan Pablo Sorín.

- No futebol, o apelido começou mesmo na minha passagem pelo Cruzeiro. Em uma partida contra o Atlético-PR, eu provoquei a expulsão de três jogadores, estava em um dia bom. Aí a torcida começou a gritar: ‘Ruy Cabeção! Ruy Cabeção!’ Acabou pegando e não teve mais como desvincular. Foi até algo relacionado ao marketing esportivo, me ajudou bastante.
O apelido engraçado não incomoda Ruy. Nem mesmo quando ultrapassa as linhas do campo e entra dentro de sua casa.

- Hoje tenho duas filhas, uma de seis anos e outra de três. A mais nova vai ao estádio e vê a torcida gritando meu nome. Quando chegamos em casa, ela pergunta meu nome. Eu digo que é Ruy Bueno Neto. Ela vira pra mim e diz que não. Que meu nome correto é Ruy Bueno Neto Cabeção!

Copa Sul-Minas

O título da extinta Copa Sul-Minas de 2002 é especial para o Cabeção, que se emociona ao narrar a epopeia do jogo final. O também lateral Sorín, fundamental naquela conquista, se tornou um dos amigos mais especiais na vida de Ruy, que faz questão de relembrar os momentos ao lado do argentino.

- O Sorín é um dos amigos importantes que fiz no futebol. Quando cheguei ao Cruzeiro, vindo do América-MG, nos concentrávamos na Toca da Raposa antiga. Entre grandes jogadores, como Luisão, Maicon, Cris e Fábio Júnior, achei uma vaga em um quarto. Não sabia que era o quarto do Sorín, o maior ídolo do Cruzeiro. Eu respeitava os ídolos. Mas aí, ele entrou no quarto, eu pedi desculpas, disse que ia sair, mas ele me pediu pra ficar e ficamos amigos. Nos falamos até hoje. Nossas famílias são amigas.

O famoso passe na final, contra o Atlético-PR, rende homenagens a Ruy até hoje. O assédio dos cruzeirenses não incomoda o Cabeção, que diz ter vivido naquela partida seu melhor momento no futebol, inclusive por se lembrar de seu falecido pai.

- Em Brasília, há muitos cruzeirenses. Todo mundo só fala daquele passe que dei para o Sorín. Foi o momento que mais marcou na minha carreira, por ser de Minas, por ter começado aqui e por saber da grandeza de todos os times. Meu pai, que era cruzeirense fanático, estava vivo, então foi uma coisa de Deus. Mineirão abarrotado, torcida do Cruzeiro em massa, e eu tive a felicidade de ter uma tarde muito boa. Até hoje, não me esqueço daquele lance. Entrei com a bola dominada e rolei pra trás. Achei que viria algum atacante e quando eu vi, vinha um cabeludo, daquele jeito todo torto e desengonçado.

Carinho pelo Glorioso

O Botafogo foi outro clube que marcou a carreira de Ruy. O lateral se lembrou da final da Taça Guanabara de 2006, contra o América-RJ, quando jogou com o tornozelo esquerdo contundido, em uma jornada que o Cabeção considera uma das mais heroicas de sua vida.

- Não posso deixar de falar de um momento marcante no Botafogo. Fomos campeões da Taça Guanabara, depois de vinte e tantos anos. Eu estava parado há 52 dias, tinha me machucado em um amistoso. O tornozelo não desinchava, doía muito. Eu parecia uma moça elegante, andando em um shopping. Fui para a final assim, machucado. Os atacantes adversários não sabiam, mas eu não tinha nem metade dos meus movimentos normais. Fui campeão, e a torcida só gritava meu nome.

Para Ruy, toda a dor que passou não foi em vão. Principalmente, porque foi reconhecido pela torcida do Botafogo como um dos grandes heróis do título do estadual.

- Na comemoração do título, o Bebeto (de Freitas, então presidente do Botafogo) fez com que fizéssemos um treino físico em Copacabana. A cidade estava pintada de preto e branco. Isso me marcou muito, arrepio só de falar. Com grandes jogadores ao lado, como Dodô, Zé Roberto, Scheidt e Lúcio Flávio, todo mundo só gritava meu nome. Isso valeu todo o sacrifício que passei.

Futuro

Ruy desmente quem pensa que sua carreira no futebol já acabou. Ele e seu Brasiliense lideram o Grupo C da Série C do Brasileiro, com nove pontos ganhos em quatro jogos. O sonho de voltar a um grande clube segue vivo. Cabeção se orgulha de vestir a camisa do Jacaré e espera um futuro repleto de histórias pra contar e com muitos sonhos ainda a viver.

- O Brasiliense é um pouco diferente de outras equipes. Muitos que estão na Série A não têm um centro de treinamentos e um próprio estádio pra jogar. E o principal, os compromissos em dia, que é uma coisa que não falta aqui no clube. Por isso, é que nós temos esta responsabilidade grande e estamos fazendo parte deste projeto de retomar a escalada para a Série B até chegar à Série A. Sou muito agradecido a Deus, porque passei por grandes equipes e não é porque estou na Série C que deixo de estar em um grande clube. Brasília é uma cidade ótima de se viver. Minha família está feliz. A única diferença é esse glamour que existe nas grandes equipes e a cobertura da imprensa.


Por Marco Antônio Astoni
Brasília



G1

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